Wednesday, September 20, 2017

MANIFESTO CU-BRASIL


(para Mari Paula. Para Retrópica)






A violência nos une. Sangue. História. Medo.
A maior cadela do mundo, o fascismo tem o rabo arrebitado.
Abaixo do equador tem tiro, indigência e carnaval. Escravo a dar com pau, a Bomba H contra todos os amores. Fugir ou não fugir: essa é a questão.
Única lei do globo, a volta completa do sol. Acidente de percurso, o ocidente foi um sonho secular.  
Só me interessa o que é sem Deus. A mulher irá se levantar. Mãe de todos os fogos. A lei será feminina. O leite jorrará das tetas pretas para a goela dos incautos. No futuro a coalhada e o estragão. Serei famosa em Madeira Santa.
Nós já cansamos da gordura no papo dos velhos desdentados. Faremos elegia do fracasso. Fatigadas do terno e da gravata, a batina do pedófilo nós pisotearemos, sua família — pai, filho e espírito santo — mataremos, da careca de Freud a Hitler efeminado.
Na mão dos ratos o queijo tem cara de dólar e as fezes alimentam a nação.
Em meio aos desnudos, quero ver qual desgraçado me vestirá.
Câncer no norte, Capricórnio no sul da morte: a vagina uma ferida tropical. De cerveja e escravas brancas, o amor publicitário tem o rabo arrebitado.
O mar latino fossa aberta da humanidade, nosso hidrogênio é artificial. Nós amamos o algoz, nosso gozo vem com surra, o imigrante é o sonho canibal.
Contra todos os imperialismos neuróticos de guerra e todas as formas certas de fazer amor, uma religião desbunde vislumbra o amanhecer no Vidigal.
O último indígena embarcou para Paris. O chão de estrelas uma galáxia penumbrosa no subúrbio. Juntas, Fazendinha e Alhambra sapateiam arabescos islâmicos ao pé do Morumbi.
Queremos a revolução troglodita das tripas, a alma europeia é um cárcere trincado, a unicidade da rebeldia terá pulso de mulher. Num dia negra, no outro travesti.
A idade das trevas da América. Os platôs da América convulsa. O novo mundo foi corroído pelas traças e por todos os boys.
Cristo aqui comeu alfafa e vomitou discórdia na província cisplatina. Cheirando a pólvora do Acre, Jesus vende droga na fronteira. É submisso e tem dinheiro na lapela.
A gramática não é nada para quem escreve com flechas, a bondade é uma mala roubada no centro de São Paulo. A Floresta Amazônica um blefe setentrional, mato escaldado de abismos.
Onde a mesa é branca, esperança e magia só podem ser negras.
A praga neopentecostal tem o rabo arrebitado. O patriarca em praça aberta degolado.
Bens de consumo impróprio, o instinto guarani, a paçoca e a costela, o charque e a chanchada. Nosso biquíni tem estampa de Natal.
No pó da estrada a cocaína da Colômbia, a usura, o recalque e a fofoca.
O assassinato da transexual ao pé do Pão de Açúcar, na Sé, no Pântano do Sul, na Estação Central. Na árvore do conhecimento a jararaca e a jiboia. Na biboca do bocó vejo Iracema jururu. 
Já não se admite o seco da brancura, a branquitude está desidratada, a elite um fantoche dos velhacos. A moral é chão militar pisado e encerado. A morte pura fuga narcótica. Não admitimos o nascimento por vontade própria. O universo é terreno inóspito, a galáxia uma quimera abissal.
O espírito lacuna verde no coração da treva, o corpo um delírio emocional. Faremos a mulher retornar ao trono sagrado, ser imortal. O pênis ereto um disparate desigual.
Perdigueiros. Grosseiros. Corriqueiros. Tinteiros. Obreiros. Terceiros. Jamais certeiros.
O instinto corrupto dos ladrões. Vira-bosta digital, povo e alta corte dançam a morte sazonal dos direitos. O humano um drone de silicone realístico do Vale do Silício. O sexo um frio colossal.
Já tínhamos a porrada na cara e o dente quebrado. A idade da corte. A transfiguração da sorte em decrepitude intelectual. Contra as osmoses correligionárias e a especulação imobiliária. Contra Ramsés II e todos os Alcorões. Contra todas as Torás e Moisés envilecido. Deus é Ranavalona II, uma gota de lágrima em cada rosto barbarizado de fome.
A democracia o sonho grego estuprado. Deu chabu. Deu azar. O rabo sempre arrebitado.
A tristeza é a prova cabal.

De Pindorama só parir com dor. O matriarcado um desejo engavetado. Vera Cruz um quase continente feito de barro arrasado e povo calado, uma força centrípeta da natureza que retrocede acelerando, uma estranha ordem vulcânica que suga a lava para dentro, fosso de lamento, marcha à ré com sorriso no rosto e samba no pé.

Sunday, April 23, 2017

Meu amor






Meu amor, você me descadeirou
Corpo fremiu, baba caiu, a alma descontrolou
O pântano que atravessei até chegar ao teu coração, terreno árido, chão rachado
A ogiva nuclear do teu olhar, minha garrucha e teu canhão, nós sem estação
A mão espalmada no norte, no sul o corte, o dedo brincando na ferida
Meu amor, você é minha vida

De lombo dormente, voz tremente, o cabelo um mar agitado de paixão

Eu tua máquina de tirar leite, em ti grudada, máscara famélica e crispada

Nossos ossos em comunicação terrena, me fazendo plena na régua da tua métrica 

Meu amor, não sou mais tétrica

O nosso espelho avariado, um rosto arrebatado de prazer 
Tua emergência penetra e enche, refocila em mim uma esperança
A vida menos lívida em jatos canta e dança 
Meus músculos te dizem meu amor, em mim a casa tua
Meu amor, para sempre me possua.

Monday, April 10, 2017

Eu e meu desejo de ser eu


(para Ricardo Nolasco. Para Momo: para Gilda com Ardor)




Eu negro o suco do meu suor grudado na roupa. Eu escuro imperfeito nadando no sebo do tempo. Eu gordo sedento comendo na borda do vento. Eu e meu desejo de ser eu. Eu claro vexame eu que recebo o gongo retumbante da natureza. Eu transexual sem igual sem moral andando nua nas ruas de uma Curitiba vazia. Eu dessa vez deficiente movendo-me loucamente sem espaço sem tez. Eu mulher parindo com dor sem amor com odor eu e o veneno da beleza. Eu branco cheirando a peste nos repolhais meus ais meus sais só reclamo. Eu e a tristeza de ser homem nos dias de hoje me arrasto. Eu e meu desejo de ser eu. Eu Momo dançante figura que sorri que samba que dança sobre o pó de uma desgraça. Eu essa farsa eu na brincadeira de perder cadeira. Eu de bruços de bode eu e meu lugar de pobre. Eu descalço tremendo percalço a caminho do abrigo. Eu lixo poroso vigor vaidoso de quem escapa para pertencer. Eu Gilda malabarista eu e meus beijos de loucura eu sem doçura pedindo dinheiro e afeto eu sem família eu sem teto. Eu e meu desejo de ser eu. Eu o mesmo eu muitos outros eu unidade multitudinária eu e minha vida ordinária. Eu e a necrofilia das relações conturbadas eu e minhas vacas sagradas. Eu cão sem dono rei sem trono eu uma vida lançada minhas pernas aladas. Eu sem mãe eu sem pai eu e o domínio do mal eu canibal. Eu tremendo de raiva eu babo eu travo eu lingote do humano. Eu sem dano eu canto eu sem pano sem traço meu desenho escasso. Eu e minha magia morrente minha estrela cadente eu sem plano. Eu amor decadente eu furacão dormente eu sem dente eu sem nada. Eu e minha língua fluente eu flâneur cosmonauta inconsequente eu sem pauta eu sem droga. Eu e meu desejo de ser eu. Eu que meu black bloc é bricabraque eu no atraque sem ganhar nem perder. Eu sem temer. Eu intenso eu penso que tenso é saber sem viver. Eu e meus sonhos mais selvagens eu nas ramagens eu pura paisagem. Eu descolado da cena eu terrena eu perene eu serena travesti. Eu obeso de alegrias e benesses eu e a tristeza que engoli. Eu que sofri eu que virei o jogo eu que dei o troco. Eu simulação do acaso eu sem tamanho eu que apago. Eu que me vire eu tortuoso eu que escorro por onde os pés já não pisam. Eu e minhas torres de marfim eu nos calabouços eu nos porões militares eu nos chãos batidos eu e meu giz. Eu e meu ego inflado eu que digo não eu ancião. Eu gato malhado eu escaldado eu outro sim eu sem fim. Eu tabagista enjaulado eu e minha cidade cárcere privado. Eu e minha ilusão eu e minha fábula eu bandido sem alma. Eu prestidigitador do infinito eu que agito eu e meu grito do sétimo andar. Eu e meu desejo de estar. 

Monday, February 06, 2017

Carta aos meus detratores

Para aqueles a quem eu não agrado, o meu foda-se. Para aqueles que me insultam, o meu foda-se. Para aqueles que me adulam para conseguir coisas, o meu foda-se mais forte ainda. Foda-se a cara do nojo, foda-se toda família tradicional brasileira que estiver vestida e fora da oca, fodam-se os burros que se atolam na lama da miséria emocional, fodam-se os espertos, esses sempre mais burros que os outros, fodam-se os políticos, fodam-se os vices, os interinos e todos aqueles em exercício, foda-se o presidente e sua mulher inepta também, fodam-se ricos e pobres em sua dança ritual fracassada, foda-se o sucesso e foda-se o malogro, foda-se todo machismo e foda-se todo feminismo radical, foda-se a peste e foda-se a riqueza exorbitante que algum velho sacana te tirou, fodam-se os novinhos da direita transante e foda-se a esquerda macumbada que não anda na linha, fodam-se os párocos, os padres velhacos tarados, as freiras em cujo peito Satanás se esconde, fodam-se pastores viciosos que arrancam dinheiro da terra da tristeza, fodam-se a televisão e a internet, foda-se a foda mal dada, incompleta, porca e mal gozada, foda-se a venda mal feita, o site que não abriu, foda-se o carro que poluiu, foda-se a namoradinha do Brasil, que de velha desdentada caiu, foda-se o apresentador troglodita que não sabe ler nem escrever, foda-se o imbecil que os outros fodidos puseram no pedestal, foda-se o mundo setentrional, foda-se a arte encomendada para vender pasta de dente, foda-se a selfie tirada na praia, o óleo de coco, foda-se a roupa no meu corpo torto, foda-se a vó, a tia e a vizinha pelancuda e depressiva, fodam-se os mortos que puderam fazer coisa em vida e não fizeram, fodam-se os filhos dos filhos dos filhos que de esperança já não carregam mais nada, foda-se o passado rebocado no fundo da gaveta, foda-se o futuro prateado, fodam-se as guerras que só enriqueceram os idiotas, foda-se a academia que só listou o que já existia, foda-se a construção cíclica de muros que uma vez erguidos precisaram ser derrubados, fodam-se os muros que ninguém viu mas muitos sentiram, foda-se o amigo esquecido, fodam-se os inimigos defuntos e vivos, fodam-se os bancos, fodam-se os tratados, fodam-se as convenções, fodam-se pais e mães, fodam-se as fronteiras, os calabouços e os calabocas, fodam-se as ditaduras, as bíblias, os alcorões e as torás, fodam-se os governos, foda-se a poesia mais fodida, foda-se o fedor da terra que queima sob o sol, fodam-se o crepúsculo e o frio, foda-se o vazio, fodam-se as corporações, fodam-se os homens que choram e as mulheres que embalam, fodam-se os dentes carcomidos dos dragões, fodam-se as bandeiras e as organizações, foda-se a literatura jamais lida, foda-se a alma ruim que foi parida.



Se vocês tiverem se fodido - mas só se tiverem se fodido - aí vocês tem minha autorização para voltar a falar comigo.